quinta-feira, 10 de março de 2011

Imprensa: «O Clube de Cinema»

«Aprender a vida através de filmes


Deixar a escola e aprender a vida através de filmes. Foi a proposta de um pai, crítico de cinema, ao filho adolescente que não queria estudar. Uma história de amor e descoberta entre um homem e um rapaz a caminho de o ser.
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O que fazer com um adolescente de 15 anos, completamente desmotivado da escola, que nem sequer se esforça por tirar notas mínimas e não está nada preocupado com o que pode vir a ser a sua vida? David Gilmour, um norte-americano que tem como profissão crítico de cinema, decidiu tomar uma decisão radical em relação ao filho: pediu-lhe que fosse viver consigo (Jesse morava com a mãe) e autorizou-o a deixar a escola, por ter chegado à conclusão de que talvez não fosse o melhor local para o filho aprender o que é importante aprender nesta idade. Com uma única condição: Jesse teria de passar três noites por semana a ver um filme com o pai. Assim nasceu aquilo a que chamaram o Clube de Cinema e que durante três anos permitiu a ambos (re)descobrirem-se como indvíduos, como pai e filho, como amigos, como membros de uma socidade. Uma história verídica sobre uma opção com grandes riscos – a nível escolar, a nível familiar e a nível pessoal.
“Escolher filmes para outras pessoas é uma coisa arriscada. De certa forma, pode ser tão revelador como escrever uma carta a alguém. Mostra a forma como pensamos, mostra aquilo que nos move; por vezes, pode até mostrar como pensamos que o mundo nos vê a nós. Por isso, quando recomendamos entusiasticamente um filme a alguém, quando dizemos ‘é o máximo, vais adorar!’, é terrível quando nos voltamos a encontrar no dia seguinte e o nosso amigo, de sobrolho franzido, pergunta: ‘Achaste aquilo divertido?’”, diz David Gilmour, como personagem principal deste livro em que descreveu o crescimento e a passagem a homem de um adolescente através de um modo pouco ortodoxo… mas eficaz.

A excepção na gramática
Gilmour começou por obrigar Jesse a ver Os 400 Golpes (1959), de François Truffaut: “Pensei que era uma boa maneira de lhe apresentar o cinema de autor europeu que, já sabia, iria aborrecê-lo até que aprendesse a ver. É como decorar uma exepção na gramática.” O acordo entre pai e filho implicava que o filme fosse debatido entre os dois, analisado e comentado. David aproveitou para explicar que Truffaut entrou para o mundo do cinema pela porta do cavalo, que tal como Jesse tinha desistido de estudar, que era um marginal, que cometia crimes sem importância, mas que adorava filmes e passou a infância a entrar à socapa nos cinemas que havia por todo o lado no Paris do pós-guerra.
Instinto Fatal (1992), de Paul Verhoeven, com a célebre cena de Sharon Stone a descruzar as pernas perante a polícia que a interrogava, foi um óptimo pretexto para discutir sexo, terror, drogas e lésbicas. Crimes e Escapadelas (1989), de Woody Allen, também entrou no pacote das primeiras semanas do Clube de Cinema. “Muita gente já viu Crimes e Escapadelas uma e outra vez mas, como acontece com os contos de Chekhov, não apreendeu toda a sua essência à primeira. Sempre considerei que o filme dos deixa perceber a forma como Woody Allen vê o mundo – um lugar onde as pessoas banais, como os nossos vizinhos do lado, consefuem sempre escapar impunes, até de um homicídio, e os idiotas acabam sempre com namoradas fantásticas”, a opinião de David é transmitida ao filho: “Chamei a atenção de Jesse para a elaboração narrativa do filme; a forma eficaz como descreve o romance entre o oftalmologista (Martin Landau) e a namorada histérica (Angelica Huston). Em breves traços, percebemos como chegaram onde estão, de um romance delirante a uma dupla de criminosos.”
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O mundo no século XX
Passagens por O Mundo a Seus Pés (1941), de Orson Welles, A Noite da Iguana (1964), de John Huston, e Há Lodo no Cais (1954), de Elia Kazan, que serviu a Gilmour não só para explicar a revolução que O Método foi na história recente do cinema, mas também esse conturbado período da vida americana que foram os anos cinquenta e a caça às bruxas: “O realizador cometeu um daqueles erros terríveis que nos acompanham para sempre: nos anos cinquenta, testemunhou de forma voluntária perante o Comité de Actividades Antiamericanas do Congresso, presidido pelo senador Joseph MacCarthy. Expliquei-lhe que durante as ‘investigações’ do comité, muitos actores, argumentistas e realizadores viram frequentemente os seus nomes incluídos numa lista negra, por serem membros do partido comunista; várias vidas ficaram destruídas. Kazan ganhou a alcunha de ‘Loose-Lips’ [‘Língua Solta’] por causa da sua disponibilidade para ‘revelar nomes’. Os críticos acusaram Há Lodo no Cais de ser, essencialmente, uma elaborada justificação para a traição dos amigos. Percebi que os olhos de Jesse se turvavam...”.
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Notícias Magazine, Fevereiro de 2011

1 comentário:

spritof disse...

Pela descrição parece ser interessante...

Vou procurar!